Embalagem de bolo como máscara de oxigênio, falta de equipamento e equipe experiente: o que se sabe sobre internação de bebê no RN

Um bebê de 3 meses com suspeita de bronquiolite foi salvo na última segunda-feira (10), em um hospital de Santa Cruz, a 120 km de Natal, depois que a equipe do hospital municipal improvisou uma embalagem de bolo como capacete de oxigênio antes de a criança ser transferida para uma UTI pediátrica em Natal. A imagem chamou atenção nas redes sociais.

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A internação do bebê na UTI do Hospital Varela Santiago aconteceu na terça-feira (11). Dois dias depois, ele foi transferido para a enfermagem, onde permanece em tratamento e apresenta boa evolução clínica, segundo os médicos da unidade de saúde.

A médica que elaborou o respirador usado pela criança durante aproximadamente quatro horas junto com sua equipe de plantão afirmou que o uso de equipamentos improvisados é mais comum do que se imagina no Serviço Único de Saúde.

Segundo a mãe do bebê, Kadja Juliane, a criança possui um quadro delicado de saúde. Ele tem hidrocefalia, usa uma bolsa de colostomia e também tem síndrome de Dandy-Walker, uma malformação no cérebro que pode causar problemas no desenvolvimento motor e aumento progressivo da cabeça.

A equipe do Hospital Municipal de Santa Cruz informou que o bebê deu entrada na unidade no sábado (8) com quadro de desconforto respiratório grave, congestão nasal, febre, rinorreia, vômitos e diarreia.

Na manhã da segunda-feira (11), a médica plantonista constatou que a criança já tinha sinais de cianose – uma condição médica que afeta o paciente com má oxigenação do sangue – e apresentava manchas roxas na pele.

Embora possuísse máscaras infantis de oxigênio, o Hospital Municipal de Santa Cruz não tinha entre seus equipamentos um capacete de oxigênio conhecido como hood, mais apropriado para uso em bebês. O produto custa cerca de R$ 500.

A prefeitura de Santa Cruz informou que a unidade de saúde do município não é referência – ou seja, não é especializada – em urgência materno-infantil.

Ainda segundo o município, a médica plantonista usou a embalagem de bolo para montar uma estrutura improvisada e atender a necessidade criança enquanto aguardava regulação para leito de UTI especializado para bebês em outro hospital.

Formada em medicina em 2015 em uma universidade privada do Rio Grande do Norte, Ellenn Salviano, de 41 anos, é natural de São Miguel, na região do Alto Oeste potiguar, mas mora em Natal.

Também formada em direito, casada, mãe de três filhos, a profissional começou a atuar em unidades básicas de saúde e depois foi convidada para o hospital municipal de Santa Cruz, onde é plantonista às segundas-feiras há quase 8 anos.

Durante a pandemia da Covid-19, Ellenn fez parte da equipe da UTI do hospital municipal.Além de Santa Cruz, ela trabalha no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) Metropolitano às terças-feiras e no Hospital de Pirangi, em Parnamirim, nas sextas.

A profissional também faz plantões em outras unidades, como a sala vermelha de uma Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) de Parnamirim e em um hospital privado de Natal, sem dia fixo.

Nos hospitais e no Samu, ela atende principalmente pacientes adultos, mas também acaba recebendo crianças e bebês em situações graves.

Responsável pelo uso da embalagem de bolo como capacete de oxigênio, a médica Ellenn Salviano, afirmou que já perdeu as contas de quantas vezes realizou o mesmo tipo de improviso com seus colegas. De acordo com ela, a prática em hospitais públicos é mais comum do que se imagina.

Somente em uma semana, a máscara usada na criança de Santa Cruz foi a terceira que ela fez. As outras duas foram no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Uma delas com papelão.

“É muito fácil chegar e dizer: mãezinha, o desfecho foi ruim. Me desculpe, porque não somos um hospital materno-infantil, porque não temos recursos para o seu filho e o SUS não tem vaga”, complementa.

Segundo a médica, o bebê estava fadigado havia dois dias, precisando de oxigênio e, por isso, corria um risco de parada cardíaca e necessidade de intubação.

Porém, com o uso do equipamento por cerca de quatro horas, até a chegada de um equipamento emprestado por outro hospital, a equipe conseguiu que o quadro de saúde da criança se estabilizasse.

‘Assumo a responsabilidade que é cuidar do outro’, disse.

“A criança estava com frequência respiratória de quase 80, com cioanose, saturando 75 a 80, com tiragem subcostal, com batimento de asa de nariz, com tiragem de fúcula, estavam bem sonolenta devido à fadiga pela falta de oxigênio no corpinho dela”, explicou.

Ainda de acordo com ela, após o uso do equipamento improvisado, o bebê passou a ter uma melhora na frequência respiratória, saiu do quadro de cianose, e começou a ter uma saturação de 99% a 100%.

“Por mais improvisado que seja, foi o que fez com que a criança estabilizasse e a gente conseguisse aguardar essa vaga de UTI por mais 24 horas”, pontuou.

Mãe do bebê, Kadja Juliane agradeceu à equipe do hospital municipal de Santa Cruz pelo atendimento ao filho. Ainda de acordo com ela, apesar do improviso, o bebê “melhorou bastante”.

A mãe também contou que a equipe médica se preocupou com a internação no hospital municipal por ele não ser pediátrico. Segundo ela, havia medo de alguma infecção devido à estrutura inadequada.

O bebê de 3 meses recebeu alta da UTI do Hospital Varela Santiago, em Natal, nesta quinta-feira (13), após apresentar melhora do quadro clínico, mas segue internado na enfermaria da unidade.

Nesta sexta-feira (14), o hospital informou que o paciente segue em quadro de melhora e processo de “desmame” da oxigenação por meio de catéter, aumentando a alimentação, e saindo do quadro respiratório que o levou à internação.

Fonte: g1 RN